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Apple, quem diria, é anfitriã da Microsoft

No mundo da tecnologia, nada é para sempre. Durante décadas, a Apple e a Microsoft alimentaram uma das mais formidáveis guerras do setor. Mas ontem, em San Francisco, enquanto a Apple apresentava seus novos produtos - dois iPhones, uma versão remodelada da Apple TV e um tablet maior para uso profissional, o iPad Pro - a Microsoft foi chamada a ocupar o palco como uma convidada especial. "Quem conhece mais sobre produtividade que a Microsoft?", perguntou o diretor-presidente da Apple, Tim Cook, antes de convidar Kirk Koenigsbauer, um vice-presidente da Microsoft, a demostrar como funcionam os programas do pacote Office - Word, Excel, PowerPoint etc - no iPad Pro. Para os applemaníacos, acostumados a pintar a Microsoft como um diabo tecnológico, não poderia haver surpresa maior. No mesmo dia, a Apple fez afagos em outro desafeto, a Adobe. Em 2010, Steve Jobs, então no comando da Apple, publicou uma carta na qual criticava duramente a tecnologia Flash, da Adobe. No texto, dizia que o Flash - um software usado para consumir vídeos e áudio, entre outras funções - era um produto "fechado", que consumia muita energia, tinha desempenho pobre e não era seguro. Por isso, concluía, não seria admitido no iPhone e no iPad. A carta suscitou muitas críticas, inclusive a de que essa era uma cortina de fumaça para disfarçar interesses comerciais da Apple. Ontem, a Adobe mostrou um novo aplicativo no evento da Apple, o Photoshop Fix. A apresentação despertou polêmica na internet por que alguns a consideraram preconceituosa. A imagem escolhida para ser "consertada" foi o sorriso de uma mulher. Polêmicas à parte, o que se viu no palco deixa claro que o mercado de tecnologia assumiu contornos muito diferentes dos primeiros tempos. E que essas mudanças tendem a se aprofundar. Desde o lançamento do primeiro Windows, no anos 80, a Microsoft assumiu uma estratégia agressiva para resguardar o sistema operacional. Qualquer movimento que parecesse ameaçar o software, um de seus principais produtos, era evitado. A versão do Office para iPad, por exemplo, só foi liberada em março do ano passado, embora o tablet esteja à venda desde 2010. O receio na Microsoft era o de que oferecer um Office compatível com o aparelho rival significaria dar um tiro no pé, porque menos gente compraria os equipamentos com Windows. Ao aparecer no evento da Apple, a Microsoft aprofunda a estratégia adotada desde que o indiano Satya Nadella assumiu a presidência da empresa, em fevereiro do ano passado. Agora, não importa mais em que dispositivo os consumidores vão usar os programas da Microsoft. O importante é estar em todos eles ou, pelo menos, nos mais importantes. A Apple também parece ter aprendido lições importantes. Em 2007, quando lançou o iPhone, Jobs ridicularizou as canetas digitais usadas em telas sensíveis ao toque, conhecidas como stylus. "Quem quer uma stylus?", perguntou à plateia na época. "Você tem de pegá-las, deixá-las de lado, você as perde... Eca! Ninguém quer uma stylus..." A stylus da Apple, lançada ontem, chama-se Apple Pencil, estará disponível nos Estados Unidos em novembro e vai custar US$ 99. O dispositivo foi criado para acompanhar o iPad Pro, que, por sua vez, lembra muito um equipamento da Microsoft: o Surface. Em vez de concorrer diretamente com o iPad como um dispositivo para acessar conteúdo - vídeos, jogos, músicas, livros etc -, a Microsoft posicionou o Surface como um substituto mais leve dos notebooks. Com duas versões, incluindo um modelo chamado Pro, o tablet da Microsoft é compatível com uma caneta digital, uma capa que vira teclado e vários tipos de mouse. O iPad Pro segue nessa linha, com um teclado do mesmo tipo. O aparelho tem tela de 12,9 polegadas, bem maior que a dos modelos anteriores, de 9,7 polegadas. Nos EUA, aonde chega em novembro, o iPad Pro vai custar entre US$ 799 e US$ 1.079. Para levar também o teclado, o consumidor terá de desembolsar mais US$ 169. Não é a primeira vez que a Apple revê uma diretriz definida por Jobs, o lendário cofundador da empresa, que morreu em 2011. Jobs era contrário aos tablets pequenos, com telas ao redor de 7 polegadas, sob a alegação de que não era possível criar aplicativos bons o suficiente para uma tela tão pequena. Em 2012, porém, a Apple lançou o iPad Mini, com uma tela não muito maior. Uma nova versão, o iPad Mini 4, foi anunciada ontem, ao preço de US$ 399. A Apple também renovou a linha do iPhone, com mais dois modelos, o iPhone 6S e o 6S Plus, cujos preços no mercado americano vão começar em US$ 200 com contratos de dois anos com operadoras locais. A principal novidade da nova geração é a tecnologia 3D Touch, que facilita o acesso do usuário aos aplicativos ao reconhecer diferentes níveis de pressão na tela. Os novos iPhone também vão tirar partido do novo sistema operacional da empresa, o iOS 9, cujo lançamento está previsto para o dia 16. Nos últimos anos, aumentaram os boatos sobre a entrada da Apple no mercado de TV. As apostas chegaram a incluir um televisor, o iTV, mas isso não ocorreu. Ontem, a companhia lançou uma nova Apple TV, pela qual se pode ver filmes e disputar jogos. Os aplicativos são as estrelas: o iTunes, da própria Apple, está lá, mas divide o espaço com rivais como Netflix e HBO.

 

Fonte: Valor

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